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Andarilhos ajudam o bebé a aprender a andar?
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Andarilhos ajudam o bebé a aprender a andar?

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Os andarilhos (também conhecidos como “aranhas” ou “andadores”) continuam a ser utilizados por algumas famílias por permitirem à criança mover-se, mesmo que não saiba andar. Além disso, há cuidadores que acreditam que os andarilhos ajudam o bebé a aprender a andar mais rápido. Mas será mesmo verdade que estes produtos auxiliam no desenvolvimento da marcha? E são seguros?

Os andarilhos ajudam no desenvolvimento da marcha do bebé?

Em declarações ao Viral, Márcia Ferreira, pediatra e técnica de segurança infantil da Associação para a Promoção da Segurança Infantil (APSI), adianta que “é um mito” a ideia de que os andarilhos ajudam o bebé a aprender a andar. 

Segundo a especialista, “não há evidência de que este produto tenha qualquer benefício em termos motores e, mesmo que tivesse, não compensaria os riscos”.

Márcia Ferreira refere uma revisão sistemática de 2017, em que se estuda “a ligação entre o andarilho e o desenvolvimento motor” das crianças.

No estudo, relata-se que “não há nenhum artigo científico que mostre benefício” na utilização destes produtos. Aliás, “alguns artigos mostram o atraso na aquisição da marcha”.

A pediatra consultada pelo Viral vinca, contudo, que os estudos existentes “são pequenos”, “poucos” e “com pouca força estatística”.

Na perspetiva da médica, a falta de estudos recentes sobre a matéria deve-se ao facto de ser “pouco ético estudar este tema, no sentido em que seria necessário observar algumas crianças em andarilhos, e outras não, no mesmo estadio de desenvolvimento”. 

Assim sendo, confirmando-se a tese de que os andarilhos prejudicam a marcha, “estaríamos a colocar o desenvolvimento destas crianças em risco”, acrescenta.

Noutro plano, há ainda uma questão específica que leva os pediatras a não recomendarem os andarilhos: “o saltar de etapas”.

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Márcia Ferreira explica que, por norma, os cuidadores compram andarilhos “na falsa esperança de que o bebé vai começar a andar mais rápido”, quando, na verdade, arriscam-se “a atrasar outras aquisições que o bebé poderia ter se estivesse no chão, por exemplo”.

Segundo a pediatra, “a criança não começa a andar se saltar as etapas anteriores”. Que etapas são essas? Começam com a capacidade de o bebésegurar a cabeça”. Depois, “por volta dos seis meses (em média), consegue manter-se sentado durante uns segundos”. 

Assim que a criança começa a conseguir sentar-se sozinha e aguentar-se nessa posição, passa para uma nova fase: se o cuidador “a colocar de pé, ela fica de pé”, mas ainda não consegue levantar-se.

Numa fase mais avançada, passa a ter a capacidade de “pôr-se de pé com apoio”. Algures durante esta fase, refere a médica, “por volta dos doze meses, começa a gatinhar”. 

Márcia Ferreira esclarece que nem todas as crianças têm um “gatinhar clássico”, algumas “deslocam-se por arrasto”, “através do arrasto do rabo, por exemplo”.

Portanto, salienta, “pôr uma criança de seis meses num andarilho” pode potenciar o abandono dessas etapas. O bebé “não se senta sozinho, não se levanta e não gatinha”, passa logo para a etapa “andar”.

Quais os riscos associados à utilização de andarilhos?

Na perspetiva de Márcia Ferreira, mais do que a utilidade (ou não) dos andarilhos, as questões ligadas à segurança são o motivo pelo qual os pediatras não recomendam estes produtos.

“A certa altura, os riscos eram tais que – mesmo havendo algum benefício de desenvolvimento – nunca seria suficiente para compensar a sua utilização”, destaca a técnica de segurança infantil da APSI. 

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Ao contrário dos potenciais benefícios, “os riscos são demasiado óbvios, evidentes e documentados” (ver aqui e aqui). Aliás, salienta a especialista, “o andarilho é o artigo de puericultura mais associado a acidentes em crianças”.

Apesar de ser sempre recomendado que as crianças sejam vigiadas quando estão em aranhas, curiosamente, frisa Márcia Ferreira, “está documentado que a maioria dos acidentes com os andarilhos acontecem sob vigilância humana”.

Isto porque este tipo de acidente “acontece muito rápido, não dando tempo, muitas vezes, ao adulto de evitá-lo, por causa da velocidade que o andarilho pode atingir”. Quais são os principais perigos associados aos andarilhos? A pediatra salienta quatro:

  • Risco de queda

De todos os perigos relacionados com os andarilhos, “o mais frequente é o risco de queda”, sobretudo em zonas com escadas ou degraus. 

As consequências destas quedas, tal como apurou um estudo português da APSI e da Sociedade Portuguesa de Pediatria, “são todo o tipo de traumatismo e fraturas ósseas”, sobretudo “lesões cranianas”, expõe Márcia Ferreira.

  • Risco de afogamento

O risco de afogamento também está documentado. Por norma, refere a pediatra, são relatados afogamentos “por quedas em piscinas”.

  • Risco de queimadura

As queimaduras podem ocorrer tanto “por quedas em lareiras” e encontrões com “radiadores”, como através de contacto com fogão. Tal como explica Márcia Ferreira, “o andarilho torna a criança mais alta do que o habitual”, permitindo que aceda a locais aos quais não chegaria normalmente.

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  • Risco de envenenamento

No mesmo sentido, a altura proporcionada pelos andarilhos também aumenta o risco por envenenamento. Segundo a médica, há uma maior probabilidade de a criança pegar e ingerir produtos prejudiciais à saúde.

Como estimular a marcha do bebé de forma segura?

Márcia Ferreira considera que “estimular todas as fases de desenvolvimento de uma forma dirigida da atenção” é a forma correta e segura de promover a marcha do bebé

O simples passo de “pôr um objeto cada vez mais longe” para a criança fazer um esforço e deslocar-se até ele é um exemplo disso. Numa fase seguinte, pode-se “colocar um objeto em cima do sofá”, para estimular a criança “a levantar-se e a agarrá-lo”.

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Para Márcia Ferreira, “é importante que as crianças tenham momentos destes, que tenham um estímulo direto e individualizado por parte do cuidador (seja numa creche, com os pais ou com os avós)”.

Quando questionada sobre se existem alternativas seguras aos andarilhos, a pediatra aconselha os pequenos parques infantis de interior. “Permitem que a criança tenha brinquedos” e “explore, por si”, – sempre sob vigilância – não saltando etapas importantes.

Numa nota final, Márcia Ferreira aconselha os cuidadores a “terem a calma necessária” na aquisição da marcha do bebé e a reportarem a um pediatra “qualquer atraso nestas etapas que comece a parecer demasiado estranho”.

9 Fev 2024 - 08:30

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